Coluna dos Arquitetos: Assis Reis #05



Assis Reis (1926 – 2011)

Francisco de Assis Couto dos Reis nasceu em Aracaju em 1926. Foi na Parnaíba, Sergipe, que o arquiteto teve seu primeiro contato com as belas artes, o desenho, a pintura e a arquitetura, quando ganhou de seu professor de topografia um livro sobre Leonardo da Vinci. Naquele momento ele quis se igualar ao grande arquiteto italiano, decidiu então viajar ao Rio de Janeiro, em 1943, para dar continuidade aos seus estudos superiores. 

A viagem fazia uma escala em Salvador. A capital baiana causou um grande impacto em seu olhar de topógrafo e também existia a possibilidade de trabalhar. Salvador passava por um momento único e promissor, pois nesse mesmo ano iniciaram-se as atividades do Escritório do Plano de Urbanismo da Cidade do Salvador (EPUCS) dirigido pelo engenheiro Mario Leal Ferreira. Após ser entrevistado por Diógenes Rebouças, a quem mostrou alguns de seus desenhos, Assis foi contratado como desenhista e topógrafo.

Conquistou uma visão global da cidade com os trabalhos realizados no EPUCS, teve então a possiblidade de estudá-la através de diversos aspectos e posteriormente de compreendê-la através de um olhar urbanístico. O Escritório se extinguiu em 1950 mas todo o aprendizado adquirido nesse período o acompanhou ao longo de sua formação e vida profissional, moldando sua forma de pensar a cidade.

Em 1950, incentivado por Diógenes Rebouças, decide iniciar seus estudos no curso de Arquitetura, o qual concluiu em 1957. A partir da conclusão do curso que construiu uma parceria com seu mestre que se estendeu até 1962. O período foi fundamental para Assis, marcado pela busca de uma arquitetura própria. Foi também uma fase caracterizada por conflitos devido sua oposição ao ideário modernista e sua aproximação com a “reinterpretação da arquitetura colonial ou neobarroca” aplicada em projetos residenciais. 

Nessa mesma época foi construída sua primeira obra, uma casa no Rio Vermelho. Sua obra começa a se aproximar da arquitetura regional e o arquiteto se posiciona criticamente junto com outros arquitetos da segunda geração sobre o rumo que tomava a arquitetura brasileira. Esses arquitetos se formaram em meados dos anos de 1950 e a produção arquitetônica surgia na década de 1960. Podem ser enquadrados nesse caso Luiz Paulo Conde, Sérgio Magalhães, Joaquim Guedes e Miguel Pereira.
Também nesse momento, Assis Reis repensa sua arquitetura e elabora em 1965 o projeto do Centro Médico Albert Schweitzer, mais conhecido como Centro Médico da Graça. Nos anos seguintes se torna professor da graduação e da pós-graduação na Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia.

Segundo o próprio arquiteto, a década compreendida entre os anos de 1968 e 1978 foi sua “década de experiências”, engloba seus projetos entre o Pavilhão Brasileiro para a Exposição Universal em Osaka e a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (CHESF). Esse foi um período em que se observou homogeneidade em seus projeto e o levou a ser consolidado profissionalmente no Brasil e em outros países. A partir desses acontecimentos, Assis havia encontrado a “capacidade de traduzir dentro de um grau de contemporaneidade, os aspectos históricos, culturais e materiais de uma região”. Enfatizou diversas vezes que a CHESF resumia tudo que havia vivido até então e era a concretização da união de três materiais: tijolo, concreto e aço. Outros projetos que também foram desenvolvidos nessa fase foram a Casa Elza Santa Izabel (1976), o Solar das Mangueiras (1976), o Solar Itaigara (1977) e o Modelo Reduzido da cidade do Salvador (realizado em duas etapas entre 1973 e 1978).

Assis Reis decide então, após essa fase, aventurar-se por um caminho até o momento não seguido. Iniciou uma série de publicações de artigos em revistas especializadas com o intuito de divulgar suas obras mais significativas, o que o levou a ser frequentemente convidado como palestrante em diversos eventos de grande porte.

Entre meados da década de 1990 até o início dos anos 2000, o arquiteto vive uma fase urbanística, devido seus diversos projetos de requalificação de alguns espaços públicos da cidade de Salvador, a exemplo da Praça da Sé, Praça da Inglaterra, Passeio Público, Morro do Cristo, Largo dos Aflitos, Santo Antônio Além do Carmo, Soledade e Lapinha, esses concretizados. Em meio a essa fase ele projeta seus dois últimos projetos arquitetônicos de grande porte: o Tribunal de Justiça da Bahia (1997) e o Anexo do Tribunal de Justiça da Bahia (2003-2007).

Quando Assis Reis viu diversos de seus projetos residenciais serem demolidos, muitas vezes devido a expansão do setor imobiliário, assim como também o desaparecimento de outros ícones da arquitetura moderna baiana, afirmou: “Salvador se aproxima a uma cidade desnorteada, verticalizada sem escala, precipitando-se a uma metrópole qualquer, inclassificada pela global massificação sacrificando o maior bem – as características antropogeográficas”.

Seus dois últimos projetos executados na Bahia, Casa de Itaparica (2008-2010) e Casa de Ubaíra (2009-2010), dividiram espaço com outros dois projetos que não foram concretizados, o Centro de Identidade Cultural de Salvador (2009-2010) e a maquete reduzida do Recôncavo Baiano.



Brutalismo na obra de Assis Reis

O conjunto de ideias do Brutalismo apresenta como uma das suas motivações a rejeição da fase racional de Le Corbusier, o que levou alguns arquitetos a reverem o embasamento teórico de seus trabalhos. A construção de Brasília foi um divisor de ideias sobre o futuro da arquitetura moderna no Brasil, a partir daí então surgiu a segunda geração de arquitetos modernistas. 
Assis faz parte dessa segunda geração, junto com outros nomes importantes no cenário nacional como Lina Bo Bardi, Mario Porto e Jaime Lerner. Teve sua visão no início muito influenciada por arquitetos do exterior, como ele mesmo falou em um congresso em Belo Horizonte em 1985, de um de seus primeiros trabalhos uma pequena habitação que projetou com características inspiradas no pavilhão de Barcelona de Mies Van Der Rohe. 

A partir de uma viagem que fez à Europa em 1957 percebeu como a cultura latina americana era desprezada e passou a reconsiderar seus valores. Essa experiência fez o arquiteto se dar conta que essas influências não condiziam com uma cidade tão rica culturalmente como Salvador, daí em diante sua produção é eminentemente regionalista. 

Em momento algum Assis classificou sua arquitetura como brutalista apesar de ter algumas características e sim como um regionalismo crítico. Ele foi um grande estudioso dos valores regionais, porque acreditava que isso o daria credenciais a realizar projetos relevantes e que não fosse um mero subproduto da arquitetura europeia. Fazendo-se uma análise da obra de Assis Reis, percebe-se que os materiais utilizados e a relação entre os espaços revelam que algumas características brutalistas sempre estiveram presentes.

Centro Médico da Graça (Salvador, 1965) 

O Centro Médico da Graça possui materiais aparentes, aplicados em sua forma bruta, sem nenhum acabamento, internamente e externamente.  Sua construção é em concreto aparente, lajes em concreto armado e fundação em tubulão. Na circulação entre os consultórios foram utilizados cobogós de vidro e na parte de serviço, cobogós cerâmicos. Estes funcionam tanto para ventilação quanto para iluminação.

Fachada do Centro Médico da Graça
(Disponível no Acervo Assis Reis)

Pavilhão de Exposição (Osaka, Japão, 1969)

As propostas para o Pavilhão Brasileiro da Expo-70, em Osaka, exprimiam as raízes da região. Ele seria desenvolvido em concreto aparente e seu volume era inspirado no uss de sistemas tecnológicos avançados. A escala, verticalidade e articulação fazia homenagem ao Elevador Lacerda.


Maquete de Estudo
(Disponível no Acervo Assis Reis)

Companhia Hidro Elétrica do São Francisco – CHESF (Salvador, 1977)

A proposta para a Chesf é a que se mostra mais próxima das ideias brutalistas. O projeto surgiu a partir de uma carta-compromisso enviada à diretoria da instituição, essa carta descrevia as intenções construtivas e estéticas da obra. Assis Reis desejava unir as tecnologias do aço, do concreto pré-fabricado e do tijolo.

O edifício foi idealizado em um único volume em sistema modular, completado pela área do restaurante e pelo Castelo D’água. Este, coincidência ou não, recorda a solução aplicada no projeto da Escola Hunstanton pelo casal Smithson. Outro ponto a ser destacado é a flexibilidade, alcançada pela ligação interior-exterior, eliminando as fronteiras físicas e psicológicas. Nos espaços interno e em forma de claustro é utilizada a iluminação zenital, esses espaços cruzados por escadas, passarelas, ventilações e reflexos aquáticos provocam um efeito visual surpreendente.

Fachada do Edifício
(Disponível no Acervo Assis Reis)


O concreto protendido e pré-fabricado foi aplicado nas passarelas e corredores. O aço cortén, por ser mais resistente à corrosão, foi aplicado nos locais de circulação entre os pavimentos, vigas de apoio, guarda-corpos e brise-soleil. O elemento dominante na composição do edifício sem dúvidas é o tijolo laminado, revelando uma identidade regional e utilizado nos revestimentos e nas paredes divisórias. 


Interior do Edifício
(Disponível no Acervo Assis Reis)

Assis também utilizou sabiamente o tijolo aparente, de forma que sua tonalidade mudasse de acordo com a incidência solar na fachada, provocando um efeito semelhante a fritura do azeite de dendê. Esses três materiais convivem harmoniosamente pois o arquiteto os empregou de forma criativa.
Uma das características da obra é a exposição natural dos materiais, sem acabamentos, assim como também são expostas as instalações hidrossanitarias, podendo ser vistas em todos os pilotis do edifício.

O prédio da Chesf respeita a relação com o entorno, a exemplo do brise soleil que protege as fachadas. O grande espelho d’água também respeita essa relação, criando um microclima agradável. A pilastraria no térreo reforça a relação fluida entre o espaço interno e externo.
Além dos projetos analisados, o arquiteto produziu dezenas de outros, alguns chegaram perto dos ideais brutalistas mas nenhum como a Chesf. Foi a partir desse projeto que Assis Reis ganhou repercussão nacional e mundial.


Manual do Arquiteto

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